segunda-feira, 7 de junho de 2010

Cantigas de escárnio:

Na cantiga de escárnio, o eu-lírico faz uma sátira a alguma pessoa. Essa sátira era indireta, cheia de duplos sentidos. As cantigas de escárnio (ou "de escarnho", na grafia da época) definem-se, pois, como sendo aquelas feitas pelos trovadores para dizer mal de alguém, por meio de ambiguidades, trocadilhos e jogos semânticos, num processo que os trovadores chamavam "equívoco". O cômico que caracteriza essas cantigas é predominantemente verbal, dependente, portanto, do emprego de recursos retóricos. A cantiga de escárnio exigindo unicamente a alusão indireta e velada, para que o destinatário não seja reconhecido, estimula a imaginação do poeta e sugere-lhe uma expressão irônica, embora, por vezes, bastante mordaz. exemplo de cantiga de escárnio.
• Crítica indireta; normalmente a pessoa satirizada não é identificada.
• Linguagem trabalhada, cheia de sutilezas, trocadilho e ambiguidades
• Ironia


Cantiga de escánio
Pero Larouco
De vós, senhor, quer’eu dizer verd


Postado por Renata

sábado, 29 de maio de 2010

Canções de Escárnio também são atuais...

Antes de tudo, este post foi dividido em três, pois tinha ficado muito grande.

Para os que sempre acompanham o Blog, demos alguns exemplos de canções de escárnio de época beem antiga, onde pudemos notar a diferença da língua, o vocabulário, etc. Mas fiquei pensando... será que não existem canções de escárnio atuais? Com essa ideia na cabeça, resolvi fazer uma pesquisa, e encontrei alguma coisa.

A primeira é uma música de Gregório de Matos e Guerra. No soneto a seguir, ele critica a "cidade da Bahia", ou seja, Salvador - ele não faz uma crítica a uma pessoa, mas sim a uma cidade, sua cultura e seus habitantes.

A cada canto um grande conselheiro.
que nos quer governar cabana, e vinha,
não sabem governar sua cozinha,
e podem governar o mundo inteiro.

Em cada porta um frequentado olheiro,
que a vida do vizinho, e da vizinha
pesquisa, escuta, espreita, e esquadrinha,
para a levar à Praça, e ao Terreiro.

Muitos mulatos desavergonhados,
trazidos pelos pés os homens nobres,
posta nas palmas toda a picardia.

Estupendas usuras nos mercados,
todos, os que não furtam, muito pobres,
e eis aqui a cidade da Bahia.

Um resumo sobre ele: Gregório de Matos e Guerra (Salvador, 23 de dezembro de 1636 — Recife, 26 de novembro de 1695), alcunhado de Boca do Inferno ou Boca de Brasa, foi um advogado e poeta do Brasil Colônia. É considerado o maior poeta barroco do Brasil e o mais importante poeta satírico da literatura em língua portuguesa, no período.
A próxima é uma música de Juca Chaves, considerado um autor atual de cantigas de escárnio. Notem que ele usa o mesmo padrão da música de Joan Garcia de Guilhade ("Dona fea, velha e sandia!"), que também é criticar uma mulher específica, sem citar nomes e encher a letra de indiretas e ironias.

Atraso Ou Solução
Juca Chaves

Já meia hora atrasada
o que em ti é natural.
Até pareces, querida,
com os nossos trens da central
isto ainda acaba mal.

Não brinques assim comigo,
com este teu vem ou não vem,
não faças de estação meu coração,
nem faças o teu de trem, tá bem?

Ai, ai, amor, ai que dor
eu sinto o ar esperar
até a chuva já veio,
mas não vens, ai, por que?
quem me dera, minha amada
se tu fostes viatura
cá da nossa prefeitura
pois te dava uma pedrada
muito bem dada.

Um resumo sobre Juca Chaves: Jurandyr Czaczkes, conhecido como Juca Chaves, (Rio de Janeiro, 22 de outubro de 1938) é um compositor, músico e humorista brasileiro. Desde os 18 anos fazia sátiras à situação política e econômica do Brasil, por meio de trovas e canções. Continua se apresentando em espetáculos pelo país, onde canta modinhas, trovas e serestas, acompanhado pelo violão ou alaúde.
Para finalizar, vamos ao último exemplo. Enquanto pesquisava as tais canções atuais que poderiam ser consideradas de escárnio, vi um comentário de alguém que dizia que a música "Uma Arlinda Mulher", dos Mamonas Assassinas, poderia ser considerada uma canção de escárnio. Eu já conhecia a música, e achei engraçado o fato de que ela talvez tivesse uma classificação assim. Curiosa, abri a letra no vagalume e li e reli várias vezes. Concordei com o tal menino do comentário; a música realmente faz uma crítica a uma pessoa, não cita seu nome e utiliza a ironia e indiretas ao longo da letra. Em alguns pontos ela pode ser considerada uma Canção de Maldizer, já que utiliza uma linguagem um tanto vulgar. De qualquer forma, achei bem interessante, e resolvi postá-la aqui.


Uma Arlinda Mulher
Mamonas Assassinas

Te encontrei toda remelenta e estronchada
Num bar entregue às bebida
Te cortei os cabelos do sovaco e as unhas do pé
te chamei de querida
Te ensinei todos os auto-reverse da vida
e o movimento de translação que faz a terra girar
Te falei que o importante é competir
mas te mato de pancada se você não ganhar

Você foi agora a coisa mais importante
que já me aconteceu neste momento,
em toda a minha vida
Um paradoxo do pretérito imperfeito,
complexo com a teoria da relatividade
Num momento crucial um sábio soube saber
que o sabiá sabia assobiar
E quem amafagafar os mafagafinhos
bom amafagafigador será

Te falei que os pediatra é o doutor
responsável pela saúde dos pé
O zoista cuida dos zóio e os oculista
Deus me livre nunca vão mexer no meu
Pois prá mim você é uma besta mitológica
com cabelo pixaim parecida com a Medusa
Eu disse isso prá rimar
com a soma dos quadrado dos catetos
é igual à porra da hipotenusa

Você foi agora a coisa mais importante
que aconteceu neste momento,
até hoje em toda a minha vida
Um paradoxo do pretérito imperfeito,
complexo com a teoria da relatividade
Num momento crucial um sábio soube saber
que o sabiá sabia assobiar
E quem amafagar os Mafagafinhos
bom amafagafinhador será

Eu fundei a Associação Internacional
de Proteção às Borboletas do Afeganistão
Te provei por B mais C que a menina
dos teus zóio não tem menstruação
Dar um prato de trigo prá dois tigres e
ver os bichos brigando é legal que só
Pois nos "tira e põe", deixa ficar da vida
sempre serei seu escravo-de-Jó

Logo agora que você estava quase entendendo
o que eu estou falando
a canção está acabando e o Creuzebek está
baixando alí o volume
e você não entende nada mesmo
por que quando você estiver em sua casa nesse momento
a música vai estar baixinha
e você não vai entender nada não sei nem por que eu estou falando esse monte de besteira
já que tudo isso é... porra, vamos parar com esse papo chato!
Vamos lá, eu já não estou aguentando mais
está doendo minha garganta
eu tenho que fazer alí gargarejo com vinagre
soltei um peido aquí dentro (caralho!)
está fedido o ambiente meus dedos estão dormentes
PelamordeDeus, parem com esta porra!

Um último resumo: "Mamonas Assassinas" foi uma banda brasileira de rock cômico, com influências de gêneros populares tais como forró e sertanejo, além de heavy metal, rock progressivo, música portuguesa e punk rock. A carreira durou de Julho de 1995 até 2 de março de 1996 (7 meses), mas não só a morte como também o sucesso foi meteórico e estrondoso.

Postado por Laura

domingo, 23 de maio de 2010

Mais uma!

Como muitos acharam interessante a diferença entre a língua portuguesa atual e a galaico-portuguesa, resolvi colocar mais um exemplo de canção de escárnio, com direito também à tradução! Aí vai:

De vós, senhor, quer’eu dizer verdade
e nom ja sobr’[o] amor que vos ei:
senhor, bem [moor] é vossa torpicidade
de quantas outras eno mundo sei;
assi de fea come de maldade
nom vos vence oje senom filha dum rei
[Eu] nom vos amo nem me perderei,
u vos nom vir, por vós de soidade[...]

(Pero Larouco)

Tradução:
Sobre vós, senhora, eu quero dizer verdade
e não já sobre o amor que tenho por vós:
senhora, bem maior é vossa estupidez
do que a de quantas outras conheço no mundo
tanto na feiúra quanto na maldade
não vos vence hoje senão a filha de um rei
Eu não vos amo nem me perderei
de saudade por vós, quando não vos vir.

Explicação:
Indiretas: “senhora, bem maior é vossa estupidez
do que a de quantas outras conheço no mundor”
Uso da ironia e do equívoco: “Sobre vós, senhora, eu quero dizer verdade
e não já sobre o amor que tenho por vós;”

Nesta canção, o autor diz que já não canta mais sobre o amor entre ele e a senhora citada, mais sim sobre a sua estupidez, feiúra e maldade.

Fonte: http://www.portrasdasletras.com.br/pdtl2/sub.php?op=literatura/docs/trovadorismo

E é isso! Esse foi mais um exemplo. Espero que tenham gostado!

Postado por Laura

Exemplo

Mais um exemplo de Cantiga de Escárnio:

Conheceis uma donzela
por quem trovei e a que um dia
chamei de Dona Beringela?
nunca tamanha porfia
vi nem mais disparatada.
Agora que está casada
chamam-lhe Dona Maria.

Algo me traz enjoado,
assim o céu me defenda:
um que está a bom recato
(negra morte o surpreenda
e o Demônio cedo o tome!)
quis chamá-la pelo nome
e chamou-lhe Dona Ousenda.

Pois que se tem por formosa
quanto mais achar-se pode,
pela Virgem gloriosa!
um homem que cheira a bode
e cedo morra na forca
quando lhe cerrava a boca
chamou-lhe Dona Gondrode.

(Dom Afonso Sanches)

Postado por Maria José

Uma canção de escárnio

Como prometemos também, aqui vamos colocar um exemplo de uma canção de escárnio e sua tradução. Notem as indiretas, as ironias e as ambiguidades nela...


Ai, dona fea, fostes-vos queixar
que vos nunca louv[o] em meu cantar;
mais ora quero fazer um cantar
em que vos loarei toda via;
e vedes como vos quero loar:
dona fea, velha e sandia!
Dona fea, se Deus mi pardom,
pois avedes [a]tam gram coraçom
que vos eu loe, em esta razom
vos quero ja loar toda via;
e vedes qual sera a loaçom:
dona fea, velha e sandia!
Dona fea, nunca vos eu loei
em meu trobar, pero muito trobei;
mais ora ja um bom cantrar farei,
em que vos loarei toda via;
e direi-vos como vos loarei:
dona fea, velha e sandia!

(Joan Garcia de Guilhade)










Tradução:
Ai, dona feia, foste-vos queixar
que nunca vos louvo em meu cantar;
mas agora quero fazer um cantar
em que vos louvares de qualquer modo;
e vede como quero vos louvar
dona feia, velha e maluca!
Dona feia, que Deus me perdoe,
pois tendes tão grande desejo
de que eu vos louve, por este motivo
quero vos louvar já de qualquer modo;
e vede qual será a louvação:
dona feia, velha e maluca!
Dona feia, eu nunca vos louvei
em meu trovar, embora tenha trovado muito;
mas agora já farei um bom cantar;
em que vos louvarei de qualquer modo;
e vos direi como vos louvarei:
dona feia, velha e maluca!

Explicação:
Indiretas: “Ai dona fea! foste-vos queixar”
Uso da ironia e do equívoco: “mais ora quero fazer um cantar em que vos loarei toda via;”

No escárnio anterior, o autor promete falar em sua poesia de uma mulher que reclamou dele por nunca tê-la citado ou elogiado numa de suas cantigas. Mas, visivelmente irritado com isso, ele a chama de feia, velha e louca.

Fonte: http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/trovadorismo/trovadorismo.php


Acho que assim pudemos visualizar melhor, não?
Continuem ligados! Mais exemplos estão por vir!

Postado por Laura